sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Navio Negreiro: a Literatura retratando a história

Dia 20 de Novembro é celebrado o Dia da Consciência Negra. Essa data foi escolhida pois esse foi o dia da morte de Zumbi dos Palmares, figura histórica e símbolo de resistência.





Falar de consciência, é algo abrangente. Nos dicionários, podemos encontrar para essa palavra, significados como "faculdade da razão julgar os próprios atos ou o que é certo ou errado do ponto de vista moral", "probidade, honradez", "opinião", ou ainda, "estado do sistema nervoso central que permite pensar, observar e interagir com o mundo exterior". Ter ou ser consciente é isso, é saber ou interagir com o mundo ao seu redor com propriedade. Então, por que um dia da consciência negra?

Em se tratando de nosso país isso é simples, quase metade da nossa população é constituída de pessoas negras, entretanto ainda vivemos em uma sociedade que exclui, discrimina, e, muitas vezes menospreza-os. Essa questão vai muito além de ser ou não racista, mas aqui também cabe a situação social e até econômica.



Consciência sim, para que possamos enxergar essas questões, e não ignorá-las. Ser consciente, em relação a isso, é saber, tomar conhecimento que sim, ainda hoje existe muita desigualdade racial no Brasil. Por isso, faz-se mister observar essas condições e conscientizarmo-nos do papel que cada um possui para que desigualdades sejam cada vez mais diminuidas, e muito em breve, extintas.

A preocupação com a situação do negro no Brasil não é atual. Ao contrário. Desde a época da escravidão, uma parcela da população, aquela mais consciente sobre a questão de igualdade de direitos, já levantava a bandeira da liberdade.

Em 1860, surgiu um grupo de escritores que demonstrava grande preocupação com os problemas sociais. A abolição da escravidão foi um tema muito comum adotado nessa época, e difundido entre os escritores. Esse grupo, pertencente ao Romantismo, em sua terceira geração, ficou denominado como condoreirismo.



 Um dos principais representantes desse período é o poeta Castro Alves. Este possuía fortes ideais políticos, e era abolicionista. Isso ficou claro em sua obra, pois durante toda sua carreira escreveu sobre esse tema. Por esse motivo, ficou conhecido com poeta dos escravos. Um de seus poemas mais importantes é Navio Negreiro. Esse poema épico, tem como a figura do herói o próprio negro.

Em Navio Negreiro, Castro Alves narra como o negro era brutalmente retirado de sua terra e trazido de maneira indigna ao Brasil. O navio, espaço presente quase na totalidade do poema, era palco dos horrores sofridos por esse povo. A esperança perdida, os sonhos destruídos, a família que ficou para trás, a angústia do porvir são retratados com maestria por esse gênio das letras.

Um dos pontos mais tocantes do poema é quando faz-se a narrativa do negro morto por alguma doença contraída no navio, e seu corpo é simplesmente jogado ao mar. Fica a reflexão: esse foi o maior dos sofrimentos, uma vida interrompida abruptamente. Não. Por mais que o poema não narre como foi a vida do negro que conseguiu sobreviver às tragédias impostas a ele durante esse desumano trajeto, sabemos que o maior dos sofrimentos os aguardavam bem aqui na nossa terra.


Outros questionamentos nos vêm à mente, quanto da prosperidade de nosso país não foi realizado as duras penas do sofrimento humano. Sim, Castro Alves sabia disso. Ele deixa isso claro no sexto e último canto do poema, quando, depois de expor todo o sofrimento a que o negro foi submetido nessa viagem infame, cita a responsabilidade de nosso povo: "Existe um povo que a bandeira empresta/ P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...".

Ainda nesse mesmo canto citando a responsabilidade do Brasil, o poeta cita "Tu que, da liberdade após a guerra,/ Foste hasteado dos heróis na lança/ Antes te houvessem roto na batalha,/ Que servires a um povo de mortalha!...". Nesse trecho, Castro Alves sugere que a derrota na guerra seria preferível a servir a um povo de mortalha.



Todo o poema nos envolve e nos faz refletir sobre o amargor vivido pelo povo trazido da África para trabalhar dura e tristemente em nosso país. A abolição ocorreu. Em 13 de maio de 1888, a lei Áurea, assinada pela então princesa Isabel, colocou fim a esse triste episódio de nossa história.

Antes o sofrimento do negro houvesse tido fim nesse dia. Sabemos que não. É necessário então, que esta não seja apenas uma data comum, mas sim um momento de reflexão sobre conscientização, percepção, humanização, para que um dia, enfim nos aceitemos uns aos outros, importando-nos apenas com nossos interiores.