(por Raquel Sacramento)
As garotas de Pemberley amam a literatura inglesa clássica, mas isso não quer dizer que desprezamos a rica produção literária brasileira contemporânea. Por isso, a resenha de hoje será do livro “Ponciá Vicêncio” da escritora mineira Conceição Evaristo, o qual foi publicado pela Mazza Edições, em 2003.
A obra nos relata a vida de Ponciá - mulher, negra e pobre - contando suas perdas desde sua infância até a vida adulta, dando ênfase à
construção de sua identidade, com base nos relacionamentos familiares e herança
cultural. Para tentar uma vida diferente daquela do interior, a personagem vai
para a cidade grande, mas acaba presa a um relacionamento abusivo e morando em
uma região de extrema pobreza. São destacadas, ainda, as vidas da mãe e do
irmão de Ponciá, mostrando seus vazios e buscas. Os dois também decidem deixar
para trás a terra que tanto conheciam e que lhes concedia o pouco sustento que
tinham e trilham uma jornada recheada de momentos que nos fazem pensar em nossa própria vida.
O livro é construído com capítulos bem pequenos e com uma
linguagem bastante simples e poética, apesar de se tratar de uma prosa. Os
temas abordados são muito profundos e interessantes, sendo a solidão dos
indivíduos um dos assuntos mais recorrentes na obra, como ocorre, por exemplo,
em “Foi tanto pavor, tanto sofrimento, tanta dor que ele leu nos olhos dela,
enquanto lhe limpava o sangue, que descobriu não só o desamparo dela, mas
também o dele. Descobriu que eram sós.” (referindo-se ao marido de Ponciá).
Ponciá Vicêncio é um “soco no estômago” para quem acha
que a abolição da escravatura resolveu as questões raciais no Brasil, vemos, na
obra, o quanto seu reflexo está presente na sociedade atual. Apesar
de relatar tristeza e sofrimento, a solidariedade, os laços do amor e a força
do povo gritam através das palavras e frases maravilhosamente estruturadas por
Conceição Evaristo.
Referência:
EVARISTO, Conceição. Ponciá Vicêncio. Belo Horizonte: Mazza
Edições, 2003.