sábado, 27 de junho de 2015

Quem é o narrador da sua história?





  • Título: O Livro dos Vilões
  • Autor: #Stepsisters - Cecily von Ziegesar; Menina Veneno - Carina Rissi; The Deeper the Thorn - Diana Peterfreund; A Menina e o Lobo - Fábio Yabu
  • Editora Galera Record
  • Tradução: Ryta Vinagre
  • Número de págs: 320

  • Hoje não trago apenas mais uma resenha. Sempre gostei de livros “vazios”, daqueles que não trazem uma análise, mas sim uma história linear fechada, com início, meio e fim. E, por mais bobo que possa parecer, O Livro dos Vilões é exatamente o oposto. Você pode pensar “ah, mas conto de fada é coisa de criança”. Só tenho uma coisa a dizer: Você está errado.


    Sempre consideramos que vilão é coisa de novela ou de história. Mas você já parou pra pensar que na SUA história existe um vilão? Ou mais, já pensou que VOCÊ pode ser o vilão da história de alguém? Cecily von Ziegesar e Carina Rissi trouxeram histórias que mostram que no “mundo real” podem existir  vilões. A velha história da madrasta que não suporta a enteada pode parecer boba, mas existe, possivelmente você encontra uma no seu bairro, na sua rua talvez. Já Diana Peterfreud mostra que dentro de cada um de nós existe um vilão em potencial, e ele se mostra quando nos decepcionam. Alguns chamam de “vingança”, Diana chama de “lado vilão”. E Fábio Yabu cria uma história espetacular a partir da fábula da Chapeuzinho Vermelho. E foi essa história que me fez chegar a seguinte pergunta: Quem narra a sua história?


    As narrativas do Livro dos Vilões são feitas a partir dos personagens considerados vilões das histórias tradicionais, respectivamente as irmãs da Cinderela, a madrasta da Branca de Neve, Malévola (bruxa da Bela Adormecida) e o Lobo Mau. É interessante imaginar como seria o outro lado das histórias que nossos pais contavam pra gente dormir. E sempre nos imaginávamos na pele dos heróis, príncipes, heroínas e princesas dessas histórias. Mas nunca ninguém se imaginou na pele dos malvados, dos vilões. Mas nossas escolhas no nosso dia a dia estão nos levando por qual caminho?
    Os quatro autores aqui citados demonstraram uma criatividade indubitável na hora de criar esses contos (confesso que imaginar uma “vingancinha” da Gata Borralheira me deu um certo orgulho da mocinha). Todos trazem uma pequena reflexão para cada um de nós: “Ate onde vai a inocência de alguém?”, “Ate onde iríamos pelo sucesso, pelo dinheiro, pela “normalidade”?”, “Será que vale a pena mentir para ser aceito?”, “Porque somos o que somos? Seríamos diferentes se tivéssemos escolha? Temos essa escolha?”. Toda história possui vários lados, vários ângulos, vários pontos de vista.
    Não estou questionando aqui a origem dos contos de fada, nem se estão certos ou errados. São histórias inventadas a partir de uma vertente, e qualquer ser racional e criativo pode inventar histórias a partir da mesma vertente. Apenas inverto os papéis, tornando você, leitor, no personagem. Quem é você na história em que você vive? Você é o narrador da sua história, ou existe um narrador que não você, te tornando apenas mais um personagem controlado pela narração? Afinal, por que o Lobo Mau é mau? Por que a rainha má é má? Por que o príncipe encantado é encantado? Consegue entender onde quero chegar?
    Os seres dos contos são o que são. São seres inanimados, inventados por alguém, e eles são o que esse alguém diz que eles são. Mas você não é assim. Você é racional, criativo, capaz de fazer escolhas e responder por suas consequências. Não podemos deixar que narrem nossa história, que definam quem somos, que nos obriguem a seguir um roteiro. Ao nascermos – sim, nascemos, não ‘fomos inventados’ – recebemos um presente chamado Livre Arbítrio, que é como se fosse uma caneta, com a qual escreveremos nossa história. Quando nos tornamos adultos, essa “caneta” é deixada exclusivamente em nossas mãos. E o que temos feito? Colocado nas mãos de outras pessoas para que escrevam nossa história? Ou temos sido nossos próprios narradores, escrevendo, vivendo?

    O Livro dos Vilões me trouxe essas questões, e, caro leitor, a uma conclusão cheguei: Ninguém nasce mocinho ou vilão. Todos temos o potencial dentro de nós, para o bem e para o mal, e os usamos alternadamente, o que nos torna vilões em alguns casos, mocinhos em outros. Não significa que vamos envenenar alguém  à certa altura, nem que seremos envenenados, mas em coisas pequenas: praticar bullying ou defender uma vítima? Devolver uma carteira perdida ou ficar com o dinheiro? Rir e filmar alguém que caiu na lama ou ajudar? Quem decide se você é vilão ou mocinho é você. Você é o narrador da sua própria história. Escreva!