Hoje
não trago apenas mais uma resenha. Sempre gostei de livros “vazios”, daqueles
que não trazem uma análise, mas sim uma história linear fechada, com início,
meio e fim. E, por mais bobo que possa parecer, O Livro dos Vilões é exatamente
o oposto. Você pode pensar “ah, mas conto de fada é coisa de criança”. Só tenho
uma coisa a dizer: Você está errado.
Sempre
consideramos que vilão é coisa de novela ou de história. Mas você já parou pra
pensar que na SUA história existe um vilão? Ou mais, já pensou que VOCÊ pode
ser o vilão da história de alguém? Cecily von Ziegesar e Carina Rissi trouxeram
histórias que mostram que no “mundo real” podem existir vilões. A velha história da madrasta que não
suporta a enteada pode parecer boba, mas existe, possivelmente você encontra
uma no seu bairro, na sua rua talvez. Já Diana Peterfreud mostra que dentro de
cada um de nós existe um vilão em potencial, e ele se mostra quando nos
decepcionam. Alguns chamam de “vingança”, Diana chama de “lado vilão”. E Fábio
Yabu cria uma história espetacular a partir da fábula da Chapeuzinho Vermelho.
E foi essa história que me fez chegar a seguinte pergunta: Quem narra a sua
história?
As
narrativas do Livro dos Vilões são feitas a partir dos personagens considerados
vilões das histórias tradicionais, respectivamente as irmãs da Cinderela, a
madrasta da Branca de Neve, Malévola (bruxa da Bela Adormecida) e o Lobo Mau. É
interessante imaginar como seria o outro lado das histórias que nossos pais contavam
pra gente dormir. E sempre nos imaginávamos na pele dos heróis, príncipes,
heroínas e princesas dessas histórias. Mas nunca ninguém se imaginou na pele
dos malvados, dos vilões. Mas nossas escolhas no nosso dia a dia estão nos
levando por qual caminho?
Os
quatro autores aqui citados demonstraram uma criatividade indubitável na hora
de criar esses contos (confesso que imaginar uma “vingancinha” da Gata
Borralheira me deu um certo orgulho da mocinha). Todos trazem uma pequena reflexão
para cada um de nós: “Ate onde vai a inocência de alguém?”, “Ate onde iríamos
pelo sucesso, pelo dinheiro, pela “normalidade”?”, “Será que vale a pena mentir
para ser aceito?”, “Porque somos o que somos? Seríamos diferentes se tivéssemos
escolha? Temos essa escolha?”. Toda história possui vários lados, vários
ângulos, vários pontos de vista.
Não
estou questionando aqui a origem dos contos de fada, nem se estão certos ou errados.
São histórias inventadas a partir de uma vertente, e qualquer ser racional e
criativo pode inventar histórias a partir da mesma vertente. Apenas inverto os
papéis, tornando você, leitor, no personagem. Quem é você na história em que
você vive? Você é o narrador da sua história, ou existe um narrador que não
você, te tornando apenas mais um personagem controlado pela narração? Afinal,
por que o Lobo Mau é mau? Por que a rainha má é má? Por que o príncipe
encantado é encantado? Consegue entender onde quero chegar?
Os
seres dos contos são o que são. São seres inanimados, inventados por alguém, e
eles são o que esse alguém diz que eles são. Mas você não é assim. Você é
racional, criativo, capaz de fazer escolhas e responder por suas consequências.
Não podemos deixar que narrem nossa história, que definam quem somos, que nos
obriguem a seguir um roteiro. Ao nascermos – sim, nascemos, não ‘fomos
inventados’ – recebemos um presente chamado Livre Arbítrio, que é como se fosse
uma caneta, com a qual escreveremos nossa história. Quando nos tornamos
adultos, essa “caneta” é deixada exclusivamente em nossas mãos. E o que temos
feito? Colocado nas mãos de outras pessoas para que escrevam nossa história? Ou
temos sido nossos próprios narradores, escrevendo, vivendo?
O
Livro dos Vilões me trouxe essas questões, e, caro leitor, a uma conclusão
cheguei: Ninguém nasce mocinho ou vilão. Todos temos o potencial dentro de nós,
para o bem e para o mal, e os usamos alternadamente, o que nos torna vilões em
alguns casos, mocinhos em outros. Não significa que vamos envenenar alguém à certa altura, nem que seremos envenenados,
mas em coisas pequenas: praticar bullying ou defender uma vítima? Devolver uma
carteira perdida ou ficar com o dinheiro? Rir e filmar alguém que caiu na lama
ou ajudar? Quem decide se você é vilão ou mocinho é você. Você é o narrador da
sua própria história. Escreva!